Diálogos com a alteridade nas obras literárias de Albert Camus e de Paul Bowles

Abstract

Diálogos com a alteridade nas obras literárias de Albert Camus e de Paul Bowles pretende ser uma análise, inspirada por teorias pós-coloniais, da interacção ocidental com a alteridade magrebina em instantes da obra destes autores que serão figurativos de um espaço e tempo restritos: o Norte de África, durante e após a Segunda Guerra mundial, e subsequente período de descolonização. Procura-se inquirir, em momentos analíticos separados, o discurso colonialista nos diversos diálogos com o "outro"; opção que visa uma leitura mais atenta de modo a alcançar conclusões parciais no sentido da existência de analogias nos diálogos com a alteridade. Na leitura das narrativas de Camus evidenciam-se os elementos do discurso colonialista numa representação que revela, apesar da crítica à política colonial, ocultação da História e algum reducionismo na apreensão da realidade. Demonstra-se neste trabalho que a sua ficção indicia uma duplicidade de sentimentos relativamente à Argélia e à ocupação colonial francesa. De facto, a sua obra expõe uma interacção baseada em preconceitos colonialistas e uma figuração tão realista quanto idealizada, que confirma um Camus dilacerado pela História. Na exegese da obra de Bowles procura-se ver em que medida os seus diálogos com a alteridade também expõem estereótipos do discurso orientalista e definir o seu fascínio pelas paisagens geográficas e humanas norte-africanas, que se afiguram locus da demanda e da desintegração da identidade; alteridade muçulmana que o Autor introduz em alternativa ao niilismo ocidental. Para além do discurso ideologicamente estigmatizado, constata-se a falta de objectividade nas suas narrativas, que se revelam uma evocação nostálgica de um ideal geopolítico e a defesa de um status quo sócio-político que participa da ideologia colonialista. Em suma, este percurso analítico evidencia a existência de um discurso que, apesar de participar do imaginário orientalista, não permite concluir sobre eventuais posturas racistas de Camus ou de Bowles. Conclui-se que as narrativas destes autores são, na verdade, testemunhos pessimistas de uma realidade, o reflexo de uma sociedade colonial essencialmente racista, que invalida qualquer relação genuína entre raças culturalmente diferentes; RÉSUMÉ:Diálogos com a alteridade nas obras literárias de Albert Camus e de Paul Bowles prétend être une analyse, inspirée par les théories post-coloniales, de l'interaction occidentale avec l'altérité maghrébine dans des instants de l'oeuvre de ces auteurs qui seraient figuratifs d'un espace-temps restreint: l'Afrique du Nord, pendant et après la Seconde Guerre mondiale et la période de décolonisation subséquente. L'objectif est d'interroger, en analyses séparées, le discours colonialiste dans les divers dialogues avec "l'autre"; cette option vise une lecture plus approfondie de manière à atteindre des conclusions partielles corroborant l'existence d'analogies dans les dialogues avec l'altérité. La lecture des oeuvres de fiction de Camus met en évidence les éléments du discours orientaliste et colonialiste dans une représentation qui révèle, malgré la critique de la politique coloniale, une occultation de l'Histoire et un certain réductionnisme dans la perception de la réalité. On démontre, dans ce travail, que sa fiction expose une duplicité de sentiments en relation à l'Algérie et à l'occupation coloniale française. De fait, son oeuvre énonce une interaction fondée sur des préjugés colonialistes et une figuration aussi réaliste qu'idéalisée qui confirme un Camus déchiré par l'Histoire. Dans l'exégèse de l'oeuvre de Bowles, on cherche à percevoir dans quelle mesure ses dialogues avec l'altérité exposent également des stéréotypes du discours orientaliste et à définir sa fascination envers les paysages géographiques et humains nord-africains qui se présentent comme lieu de quête et désintégration de l'identité; altérité musulmane que l'Auteur introduit en alternative au nihilisme occidental. Outre le discours idéologiquement marqué, on relève le manque d'objectivité dans ses textes qui se révèlent être l'évocation nostalgique d'un idéal géopolitique et la défense d'un status quo sociopolitique participant de l'idéologie colonialiste. En résumé, ce parcours analytique met en évidence l'existence d'un discours qui, bien que participant de l'imaginaire orientaliste, ne permet pas de conclure sur d'éventuelles postures racistes de Camus ou de Bowles. En conclusion, leurs textes fictionnels sont, en vérité, des témoignages pessimistes d'une réalité, le reflet d'une société coloniale, raciste dans son essence, qui annihile toute relation authentique entre races culturellement diferentes; ABSTRACT:Diálogos com a alteridade nas obras literárias de Albert Camus e de Paul Bowles offers an analysis, inspired by post-colonial theories, of Western European interaction with Maghrebian alterity in some moments of these authors' literary works which portray a limited place and time: Northern Africa during and after the Second World War as well as the period of decolonization which followed. In distinct analytical chapters, this thesis focuses on colonialist discourse within the different dialogues with the "other". This approach allows a more detailed interpretation and enables conclusions which corroborate the existence of analogies among these dialogues. After having examined the narratives of Camus, several elements of colonialist discourse became evident. Despite his critique of colonial policy, his depiction reveals a concealment of History and a certain reductionism in its perception of reality. Furthermore, his fiction exposes an emotional disingenuousness in relation to Algeria and the French colonial occupation. In fact, his work expresses an interaction based on colonialist biases and a depiction as realistic as idealized which confirms Camus as a writer torn apart by the forces of History. The exegesis of Bowles' fiction observes how his dialogues with alterity echo certain stereotypes of Orientalist discourse. Furthermore, it unveils his fascination with the Northern Africa geographical and human landscapes, which appear to be a locus for his search for identity and eventually of its disintegration; the Muslim alterity, which the Author presents as an alternative to Western nihilism. Apart from his ideologically stigmatized discourse, the lack of objectivity in his narratives is notable. This reveals a nostalgic leaning towards a certain geopolitical ideal and the defence of a socio-political status quo which participates of colonialist ideology. In conclusion, this analytical journey confirms the existence of a discourse which, despite the preconceptions within its Orientalist imagery, does not allow any firm conclusion to be drawn on possible racist posturing on the part of Camus or Bowles. In truth, the authors' narratives bear pessimistic witness to a reality, a reflection of an essentially racist colonial society which invalidates the possibility of any genuine relationship between culturally different ethnic groups.