Os itinerários geográficos e culturais dos objetos etnográficos não europeus do Museu Nacional de Arqueologia

Abstract

A presente dissertação constitui um estudo sobre as coleções etnográficas não europeias incorporadas no Museu Nacional de Arqueologia, fundado em 1893 por José Leite de Vasconcelos. O Museu possui uma “coleção comparativa”, cujas origens remontam aos primeiros anos de existência da instituição, entre os finais do século XIX e início do século XX. O objetivo desta coleção era, como o próprio nome indica, a comparação dos artefactos nacionais, de modo a estabelecer a identidade do “Homem Português”, com objetos pertencentes a outras culturas e civilizações, nomeadamente dos conotados à época “selvagens contemporâneos”, referente às populações autóctones das ex-colónias portuguesas. Com enfoque em três casos – uma panela Cocron do grupo étnico brasileiro Kaingang, uma máscara africana da região dos Dembos (Angola) e um conjunto de artefactos doados por Alberto Osório de Castro – este estudo reconstitui os itinerários geográficos e culturais percorridos pelos objetos, bem como os intervenientes envolvidos (desde a génese até à efetiva incorporação no MNA). A Pesquisa de Proveniência aplicada, recorrendo a fontes historiográficas primárias e secundárias inseridas em diversos arquivos e bibliotecas, determina uma análise crítica sobre os processos e dinâmicas de recolha destes objetos, bem como a inclusão e perspetiva do “Outro” nas narrativas museográficas perpetuadas pelas potências europeias. Esta metodologia enquadra-se numa corrente descolonizadora e transparente dos museus e do tratamento das coleções não europeias, adquiridas em contextos sensíveis e de desequilíbrio de poder, como os coloniais. A investigação propõe ainda uma proposta de salvaguarda para as peças analisadas, permitindo a sua valorização no âmbito identitário e patrimonial, de forma globalizante e democrática; - The geographical and cultural itineraries of the National Archeological Museum’s non-European ethnographic objects. Abstract: The present dissertation constitutes a study of the non-European ethnographical collections in the National Archeology Museum, founded in 1893 by José Leite de Vasconcelos. The Museum holds a "comparative collection", which origins remote back to the first years of the institution, between the late XIX century and early XX century. The aim of this collection was, as the name itself suggests, the comparison of the national artifacts in order to establish the identity of the “Portuguese Man”, with objects belonging to other cultures and civilizations, namely those connected to the “wild contemporaries “ epoch, referring to the autochthonous populations of the former Portuguese colonies. With emphasis on three individual cases - one Cocron pan from the Brazilian ethic group Kaingang, one African mask from the region of Dembos (Angola) and one set of artifacts donated by Alberto Ósorio de Castro - this study reconstructs the geographical and cultural journey taken by these objects, as well as the parties involved (since its genesis up until its effective incorporation into the MNA). The Provenance Research applied, using primary and secundary historiographical sources found in several archives and libraries, sets a critical analysis pf the processes and collection dynamics of these objects, as well as the inclusion and perspective of the Other in the museographical narratives perpetuated by the European powers, in a decolonizing and transparent movement in the museums and the treatment of non-European collections, adquired in sensitive contexts and imbalance of power, such as colonial. The investigation proposes also a safeguard proposal for the studied pieces, allowing for their valorization in the context of identity and heritage, in a global and democratic way.