A Fortaleza de Mazagão: bases para uma proposta de recuperação e valorização

Abstract

Introdução - A Fortaleza de Mazagão, em Marrocos, tem a particularidade de ter sido integralmente concebida e construída num muito curto espaço de tempo, entre os anos de 1541 e 1542, correspondendo a um período muito específico da evolução do modelo da fortificação de transição. Possui características difíceis de encontrar noutra fortificação sua contemporânea, num período caracterizado pela mudança ao nível da forma e funcionamento das fortificações, devida à evolução das armas de fogo. O conjunto existente, que mantém uma parte importante da sua estrutura original, apresenta-se insuficientemente mantido, mas possui, no entanto, potencial para ser muito valorizado se for sujeito a uma intervenção correcta. Na actividade profissional desenvolvida na Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais / Direcção Regional de Edifícios e Monumentos do Sul, desde 1997, tive a oportunidade de realizar projectos de recuperação e acompanhamento de obra em estruturas fortificadas, o que me sensibilizou para as questões que envolvem este tipo de intervenção. Uma intervenção de conservação e reabilitação a realizar no todo ou em parte de uma estrutura fortificada deve ser precedida de uma análise exaustiva à totalidade do conjunto, de modo a adquirir um conhecimento efectivo sobre os seus aspectos funcionais e construtivos. Este trabalho é fundamental para a definição de critérios de intervenção e escolha de soluções duradouras. Tratando-se de um monumento histórico, a intervenção a realizar deverá ter, como primeira preocupação, o respeito pela autenticidade histórica e material do conjunto. Sendo o património construído um recurso não renovável e o conhecimento um processo dinâmico em constante actualização, é fundamental a preservação do elemento original. A presente investigação incide sobre a Fortaleza de Mazagão e tem por objectivo a definição de bases para uma intervenção no conjunto, tendo em vista a sua recuperação e valorização. O estudo divide-se em duas partes distintas. A primeira parte, de análise da fortaleza, consiste, essencialmente, num trabalho de recolha de informação para a caracterização do conjunto. Em relação à análise histórica, é abordado o contexto da sua construção, os principais acontecimentos até à data de retirada dos portugueses e os trabalhos realizados após esta data. Como metodologia de investigação, procura-se, quando possível, o recurso a documentos originais. No que respeita à descrição funcional da fortaleza, esta é realizada estabelecendo comparações entre o existente e as representações antigas que possuímos, de modo a compreender a sua evolução. Em seguida, efectuamos uma análise tipológica da fortaleza, localizando-a no período da fortificação de transição e relacionando-a com modelos contemporâneos. É feita, em seguida, uma abordagem sobre a análise construtiva que corresponde a um estudo sobre os materiais e sistemas construtivos utilizados no conjunto. A segunda parte da investigação incide sobre a proposta de recuperação e valorização. Deste modo, é abordado o estado de conservação em que a fortificação se encontra, realizando 0 levantamento e identificação de patologias e incluindo a elaboração de um relatório de inspecção ao imóvel. O último capítulo incide sobre a proposta de intervenção. Aqui, definimos os princípios orientadores, assim como as acções preliminares e complementares em relação à intervenção. Conclui-se com a proposta de intervenção, que inclui a descrição dos trabalhos a realizar. E ainda delineado um plano de manutenção regular do conjunto fortificado. Face à escassa documentação disponível sobre o conjunto existente, o estudo passou por um processo de observação e avaliação das estruturas construídas, directamente no local. Este trabalho de pesquisa obrigou à observação cuidadosa e em pormenor dos elementos construtivos, relacionando-os entre si e comparando-os com os documentos antigos disponíveis, com o objectivo de aprofundar o conhecimento sobre a evolução da construção. Em Marrocos, nas cidades de Rabat e El Jadida, foram consultadas as entidades que directamente se relacionam com o património, com o intuito de aprofundar a investigação, procurando informação relativa à história da fortaleza após a retirada dos portugueses e às intervenções efectuadas a partir dessa época. Procurámos ainda levantamentos actualizados do conjunto e zona envolvente, fotografias antigas e elementos de carácter geral. Quanto à informação existente em Portugal sobre a fortificação, limita-se, quase exclusivamente, a dados de carácter histórico, tendo por limite a data da retirada dos portugueses da praça. A ausência de documentação gráfica actualizada sobre esta estrutura fortificada obrigou-nos à realização do levantamento de um conjunto de elementos, de modo a reunir informação essencial para o desenvolvimento da investigação. Todos os desenhos de levantamento apresentados foram realizados expressamente para este estudo. Foi ainda efectuado um levantamento fotográfico, que constitui um indispensável complemento do texto. Por uma questão de organização, optou-se por agrupar os desenhos e as fotografias referentes a cada um dos capítulos, no seu final. O presente estudo debruça-se apenas sobre o perímetro fortificado, não se ocupando com a estrutura urbana existente no seu interior, nem com os seus importantes edifícios, como é o caso do Castelo manuelino, da Cisterna e das igrejas.