As forças armadas portuguesas: desafios numa sociedade em mudança

Abstract

A dissertação que se apresenta, para efeitos de candidatura ao doutoramento em Sociologia, tem como objectivos caracterizar a situação actual das Forças Armadas portuguesas e identificar as suas prováveis tendências futuras, para num segundo momento contribuir para a análise das diversas formas de relacionamento das Forças Armadas com a sociedade portuguesa, e com particular incidência na Região Militar Sul. A rápida e, por vezes, brusca mudança na sociedade actual tem impactes aos mais diversos níveis, e as Forças Armadas sofrem essa influência à semelhança do que acontece em outros grupos profissionais e instituições sociais. Num momento em que tanto se discute o conceito de globalização, as questões que se reportam à segurança e defesa encontram-se manifestamente influenciadas por esta realidade e que se traduz na existência de novas formas de conflitualidade, que de modo rápido ultrapassam as fronteiras nacionais e transformam-se em sérios desafios mundiais à segurança humana. Está-se perante um mundo mais incerto e formado por complexos riscos e onde as ameaças não são facilmente identificadas. Face a inúmeros determinantes de mudança nas Forças Armadas, foi possível identificar tais alterações em três planos privilegiados: doutrina militar, estrutura orgânica e missões executadas. Assim sendo, as actuais Forças Armadas portuguesas baseiam a sua actuação numa renovada doutrina militar, determinada pelo seu enquadramento em organizações internacionais, com especial destaque para a NATO, que a partir do início dos anos 90 viu alterados os seus objectivos de actuação. Mutações que também se evidenciam no plano estrutural, e que remetem necessariamente para o progressivo processo de inserção das Forças Armadas no aparelho de Estado e consequente supremacia civil-governativa. Nos últimos anos, destacam-se como elementos relevantes das missões confiadas à força militar o envolvimento em operações de manutenção da paz e a cooperação técnico-militar. Enquanto que no plano nacional, se realçam as designadas outras missões de interesse público, as quais constituem um importante factor de entrosamento das Forças Armadas na sociedade portuguesa. Integrada no objectivo geral de modernização da sociedade portuguesa, a modernização das Forças Armadas assenta numa perspectiva de conjunto e frequentemente combinado, confere primazia a um modelo de organização modular e flexível, com vista à sua actuação em diversos cenários. Perfil que determina a necessidade de reequipamento das mesmas, e consequentemente de atribuição dos meios materiais indispensáveis para o cumprimento das missões que lhe estão atribuídas. Facto que se contrapõe à generalizada tendência para a redução das despesas militares, pese embora a situação portuguesa manifestar de forma mais acentuada essa tendência, o que deixa antever um futuro não muito promissor para as Forças Armadas portuguesas. No que concerne ao segundo momento de abordagem do presente estudo verifica-se que, embora o papel dos militares na sociedade actual se encontre em manifesta evolução e o seu impacte directo na envolvente social se revele cada vez mais ténue, os laços de interajuda e cooperação continuam a manifestar-se. Facto ainda mais evidente quando se trata de concelhos mais carenciados e de menor dimensão, onde a presença de militares continua a ser considerada um vector de verdadeiro dinamismo, aos mais diversos níveis. Situação que está bem patente na denominada Região Militar Sul. A necessidade de articulação entre a actuação militar e a dos outros agentes da sociedade está subjacente à natureza das missões que são atribuídas às Forças Armadas. Embora todas elas se reportem à preservação e defesa dos interesses nacionais, são as outras missões de interesse público que pressupõem uma mais acentuada interligação. À Marinha e à Força Aérea, pela sua especificidade, estão atribuídas em permanência um maior número de actividades dessa natureza. Todavia a actuação das forças terrestres também merece especial destaque. A componente do ensino e da formação surge como uma área de reconhecida importância para o entrosamento das Forças Armadas e sociedade. E no caso português, muitos são ainda os desafios que se colocam. Os modos de adaptação das Forças Armadas à sociedade têm vindo a evidenciar formas diversas ao longo dos tempos, em que no momento actual se reportam privilegiadamente aos denominados modelos de integração técnica e atitude "civilista". Em paralelo, a percepção que a população em geral tem dos militares traduz-se numa certa indiferença associada a um não reconhecimento da importância da instituição militar, embora não originem ligações do tipo conflitual. Essas manifestam-se sim ao nível do relacionamento político-militar, e em que os próprios militares reconhecem a disfuncionalidade dos efeitos de tal situação, num futuro tendencialmente próximo.